Recentemente o Governo do Estado do Mato Grosso tentou avançar um projeto conhecido também em Mato Grosso do Sul como “Lei da Pesca”. Uma lei que, apesar de parecer importante para a preservação não só dos recursos hídricos como das espécies que habitam estes recursos, não dialoga com a pluralidade dos contextos sociais que sobrevivem dessa atividade.
Nesse sentido, a lei que vem de cima para baixo, impacta diretamente no modo de vida das comunidades tradicionais que habitam e sobrevivem destes recursos: os ribeirinhos que, por sua vez, são parte importante da cultura pantaneira, seja do sul ou do norte.
É fato que precisamos de Políticas Públicas ambientais para termos um aporte jurídico na conservação do nosso bioma, porém essas políticas devem ser favoráveis também à justiça social. Em outras palavras, coibir a pesca artesanal significa também coibir a existência dessas comunidades e, portanto, promover as desigualdades entre os povos pantaneiros.
Para tanto, tal tentativa que vem tentando se instalar em solo sul pantaneiro desde o “Cota Zero”, é também uma prática inconstitucional considerando que fere o direito básico da Política Nacioinal de Desenvolvimento Sustentável da Aquicultura e da Pesca (Lei nº 11.959/2009) que “regulamenta a atividade e define os pescadores artesanais como aqueles que exercem a pesca de forma independente, com meios de produção próprios ou em regime de economia familiar”.
Nesse sentido, os pescadores também possuem o direito de participação na construção dessas políticas públicas, sobretudo através do Conselho Nacional de Aquicultura e Pesca. Sendo assim, o IPEDI se posiciona abertamente em favor da mobilização dos pescadores das comunidades ribeirinhas não só do Pantanal Sul, mas de todo o Pantanal.
Deste ponto seguimos a ideia do filósofo quilombola Antônio Bispo dos Santos (o “Nêgo Bispo”) em que é preciso desmentirmos o “mito de que degradamos o ambiente, de que somos culpados pela extinção dos animais” (BISPO, 2023, p. 86).

"Nêgo Bispo"
É preciso então que as políticas públicas tenham os povos tradicionais como aliados da conservação da nossa natureza e não como inimigos. Considerar, desta forma, que os ribeirinhos estiveram aqui, observando o fluxo destes rios, desde muito antes dos cientistas modernos que enjaulam o conhecimento e, como consequência, respaldam o pensamento excludente que separa o povo da natureza.
Estas políticas precisam nascer em diálogo com estes povos, precisam prever incentivos financeiros às capacitações, à Educação Ambiental, mas não do Outro para a comunidade e sim da comunidade entre a própria comunidade. É um meio de não só fortalecer os aliados da natureza, como também reconhecer que estes possuem notório saber e são dignos da autonomia e do respeito.